Assédio no trabalho

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Assédio no trabalho

O assédio no trabalho (e abuso de autoridade) é um assunto que, infelizmente, apesar da existência de inúmeras campanhas de sensibilização sobre o assunto, ainda se encontra bastante presente na nossa sociedade, em pleno século XXI.

Na sequência do inquérito realizado pela “Ethics at Work 2024” do Institute of Business Ethics, que em Portugal foi realizado em parceria com a Universidade Católica do Porto – Business School, e cujos resultados foram divulgados a 12 de novembro na Conferência Anual do Fórum de Ética, percebeu-se que os trabalhadores portugueses são dos que têm menos probabilidades de fazer uma denúncia depois de terem conhecimento de uma má conduta.

Cumpre indagar, já que se fala cada vez mais deste assunto, por que razão continua a sopesar o medo de represálias perante a delação direta ou por interposta pessoa destes comportamentos nocivos e irremediavelmente ilegais?

Teremos, de premeio duas ordens de razão: por um lado, a convicção generalizada de que a denúncia de assédio (ou abuso de autoridade) não vai surtir o efeito desejado, seja junto da Entidade Empregadora seja a nível judicial, com a crença de que os Tribunais não são ou suficientemente severos ou desacreditam a vítima; por outro, a ideia de que a entidade com competência administrativa e fiscalizadora não responde de modo cabal e em tempo útil às queixas que recebe, perdendo-se, assim, o fator de imediatismo.

Realça-se que não é necessária a existência de um longo processo ou sucessão de acontecimentos para que a respetiva conduta seja considerada assédio. Não é necessária a prática reiterada de comportamentos abusivos. A questão da individualidade está dependente da gravidade da conduta do assediador.

Noticiou recentemente o Jornal Público que as denúncias de assédio sexual na indústria da música, artes performativas e ensino já ascende a cem. Um número, certamente, reduzido perante a efetiva realidade e número de vítimas.

Mas, não se espante o reverso da medalha, pois muitos há que ainda utilizam a associação (perfeitamente legítima) do movimento #metoo com a cultura woke ou com a woke politics, para desacreditar as inúmeras vítimas que denunciam o seu agressor, independentemente do tempo que terá decorrido do(s) episódio(s) de assédio. Esta confusão é reflexo de uma sociedade pouco culta e madura, e de instituições que, à semelhança, ainda não souberam acompanhar a evolução social.

O assédio, seja ele moral ou sexual, é determinado não só por condutas de “facere”, mas também por condutas de “non facere”, ou seja, a não atribuição de tarefas ao trabalhador, a não convocatória deste para uma reunião laboral ou a não comunicação de qualquer formação essencial à atividade profissional do trabalhador, são condutas de “non facere”, que incentivam o isolamento do trabalhador, comportamento considerado assediador.

No regime jurídico português, o assédio encontra-se elencado no artigo 29º do Código de Trabalho, sendo considerada uma contraordenação muito grave, e no artigo 154º-A do Código Penal, com a epígrafe de “Perseguição”. Também o Regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas considera discriminação o assédio a candidato/a emprego ou a trabalhador/a (artigo 15º).

No âmbito do direito laboral, o denunciante e as testemunhas por si indicadas não podem ser sancionados disciplinarmente com base em declarações ou factos constantes dos autos de processo, judicial ou contraordenacional, desencadeado por assédio. No artigo 23º do Código de Trabalho, vêm estabelecidos uma série de fatores de discriminação, associando-se o assédio à prática discriminatória e estabelecendo-se um juízo de censura relativamente a práticas, que se traduzem, não apenas num tratamento diferenciado por si, mas também num tratamento desvantajoso, irrazoável e sem motivos, de trabalhadores em função de certos elementos categoriais, considerando-os inaceitáveis e atentatórios da dignidade humana

No mesmo Código, encontram-se consagrados o direito à igualdade no acesso a emprego e no trabalho, a proibição de discriminação e a inclusão neste conceito do assédio a trabalhador.  No tocante à justa causa de resolução do contrato por parte do trabalhador, faz menção à ofensa à integridade física ou moral, liberdade, honra ou dignidade do trabalhador, conduta esta punível por lei, incluindo a prática de assédio denunciada ao serviço com competência inspetiva na área laboral praticada pelo empregador ou seu representante. Por último, relativamente aos acidentes de trabalho e doenças profissionais, este mesmo diploma legal, dita que a responsabilidade pela reparação dos danos emergentes de doenças profissionais resultantes da prática de assédio é do empregador.

Para as empresas com sete ou mais trabalhadores, a lei consagra o dever de elaboração de códigos de boa conduta para prevenir e combater o assédio no trabalho. Além disso, sempre que tenha conhecimento de alguma situação de assédio no local de trabalho, a entidade patronal fica obrigada a instaurar procedimentos disciplinares. O desrespeito por estas regras constitui contraordenação grave.

Entre diversas medidas que as entidades patronais podem adotar com vista à prevenção e combate ao assédio no local de trabalho, destacamos o empenhamento conjunto da entidade empregadora e dos representantes dos trabalhadores e de todos os trabalhadores e trabalhadoras na criação de um ambiente de trabalho sem violência; a distribuição regular de informação sobre a política de prevenção de assédio nos locais de trabalho, a promoção de ações de formação sobre prevenção de assédio no trabalho a todo o pessoal, incluindo as chefias; a proibição no local de trabalho de quaisquer calendários, literatura, posters ou quaisquer materiais com conteúdos de natureza sexual; a indicação do local e do modo como as eventuais vítimas de assédio podem obter ajuda; a criação de procedimentos formais de queixa sobre eventuais situações de assédio; o envolvimento dos serviços internos e externos de segurança e saúde no trabalho com o objetivo de prevenir e combater situações de assédio no trabalho e a garantia de confidencialidade.

Mesmo que não assumido ou denunciado, o assédio, sexual ou moral, infeta o ambiente de trabalho, traduzindo-se na criação de um mal-estar vigoroso. As vítimas vêm normalmente a sua saúde, confiança, moral e desempenho profissional afetados, o que leva à diminuição da eficiência laboral e mesmo ao afastamento do trabalho por motivo de doença. Em alguns casos, as vítimas de assédio deixam de ser capazes de socializar, acabando por se afastarem, seja no local de trabalho, seja no seu dia-a-dia. O assédio pode desencadear diversas alterações neurológicas, como por exemplo o stress pós-traumático, podendo até conduzir ao suicídio.

Entendemos que as situações de assédio no trabalho podem ser muito difíceis de identificar, de relatar e até de provar. Pode ser complicado optar por fazer uma queixa, sabendo que se trata de situação de difícil prova e que, lamentavelmente, pode ter consequências negativas para o denunciante. Ninguém é obrigado a realizar uma denúncia, porém, o aumento da visibilidade destas situações e a responsabilização dos/as seus/as autores/as pode contribuir para a diminuição do assédio no trabalho.

Independentemente do sexo ou cargo hierárquico do assediado, é importante que, por mais complicado que seja expor a conduta do assediador, esta seja denunciada às entidades competentes, sejam elas o departamento de recursos humanos da empresa, seja à Comissão para a Igualdade no Trabalho e no Emprego (CITE), ou mesmo um advogado. A conduta assediadora não pode ser desvalorizada, dado o facto de esta violar direitos constitucionalmente consagrados e ter repercussões enormes na vida da vítima.

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