O Crédito Compensatório – não é hush money nem um sustento para a vida

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O Crédito Compensatório – não é hush money nem um sustento para a vida

A figura do “crédito compensatório” encontra-se prevista no artigo 1676.º, n.º 2 do Código Civil. A sua relevância prática é assinalável, ainda que poucos sejam os casos onde, no contexto onde pode ser aplicada, é requerida. Esquecimento ou desconhecimento, o nosso objetivo é despertar a consciência, tanto do cidadão como do causídico que o represente.

Num caso recente discutido em 2024 no Tribunal da Relação do Porto, veio a Autora, divorciada, peticionar uma compensação de €250.000,00, alegando que na constância do matrimónio abdicou da sua valorização profissional em prol da família, enquanto o Réu beneficiou dessa dedicação na progressão da sua carreira. O Tribunal reconheceu o direito ao crédito compensatório, afirmando que, citamos “sempre que se verificar assimetria entre o contributo dos cônjuges para os encargos da vida familiar, o n.º 2 do artigo 1676.º admite a atribuição de um crédito de natureza patrimonial, tutelando a diminuição da capacidade aquisitiva do cônjuge que sacrificou, designadamente, a sua carreira profissional”. Portanto, um dos casos mais evidentes de aplicação do crédito compensatório é quando um dos cônjuges decide prescindir do seu emprego para se dedicar ao lar e aos filhos, ou seja, em favor da vida em comum do casal. Outros casos se enquadram paradigmaticamente, como, por exemplo, quando um dos cônjuges exerce a sua atividade laboral, contribuindo assim com os seus rendimentos para os encargos da vida familiar, e também realiza todas ou a maioria das tarefas domésticas e cuida dos filhos ou quando um dos filhos do casal sofre de uma deficiência incapacitante que implica que um dos cônjuges tenha de trabalhar a tempo parcial para conseguir fornecer o maior cuidado possível a esse filho.

Apesar da evolução positiva verificada nas últimas décadas, a mulher continua, em regra, a assumir um papel mais ativo na gestão da vida familiar e no trabalho doméstico do que o homem. De acordo com o estudo da Fundação Francisco Manuel dos Santos, “As mulheres em Portugal, hoje”, verifica-se que, enquanto a maioria dos homens mantém uma postura passiva relativamente às tarefas não remuneradas ligadas ao cuidado do lar e dos filhos, muitas mulheres acumulam tais responsabilidades com uma participação crescente nas despesas familiares.

Importa sublinhar que o crédito compensatório não se confunde com a pensão de alimentos – que todos conhecem. Embora ambas as figuras se relacionem com questões de sustento e compensação económica, têm natureza e finalidades distintas. O crédito compensatório visa repor o equilíbrio patrimonial entre os ex-cônjuges, compensando aquele que, em virtude da sua dedicação à vida familiar, sofreu uma perda económica sem contrapartida. Já a pensão de alimentos tem como objetivo assegurar a subsistência de quem não dispõe de meios próprios, podendo destinar-se a filhos, ex-cônjuges ou outros dependentes.

Da leitura da lei percebemos que esta figura surge como possível quando “a contribuição de um dos cônjuges para os encargos da vida familiar for consideravelmente superior porque renunciou de forma excessiva à satisfação dos seus interesses em favor da vida em comum, designadamente à sua vida profissional, com prejuízos patrimoniais importantes, esse cônjuge tem direito de exigir do outro a correspondente compensação”. Por outras palavras, quando se assiste a uma maior oneração de um dos cônjuges com a vida familiar, tendo renunciado à satisfação dos seus interesses em favor da vida em comum, com isso sofrido prejuízos patrimoniais importantes, este mecanismo tem como finalidade a reposição do equilíbrio entre os ex-cônjuges. É uma manifestação da regra segundo a qual não deve resultar do divórcio, nem o enriquecimento, nem o empobrecimento dos ex-cônjuges.

A aplicação prática deste instituto depende da verificação dos seus pressupostos:

  1. Contribuição de um dos cônjuges para os encargos da vida familiar consideravelmente superior ao exigível
  2. Renúncia excessiva à satisfação de interesses pessoais, designadamente profissionais;
  3. Existência de prejuízos patrimoniais relevantes;
  4. Nexo causal entre os prejuízos e os comportamentos acima descritos.

Em suma, o crédito compensatório constitui um mecanismo de reposição do equilíbrio patrimonial entre os ex-cônjuges, dependente do preenchimento de determinados pressupostos legais. Para além da sua relevância teórica, revela uma importante dimensão prática no Direito da Família Contemporâneo, refletindo uma sensibilidade acrescida às desigualdades de género e aos sacrifícios pessoais inerentes à vida conjugal.

 

 

 

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